Doenças raras: explicação vem da genética

2010-07-06

Milhares de brasileiros dependem de medicamentos órfãos para conviver com os sintomas de patologias incomuns  

Porfiria, cistinose e hiperamonemia são doenças raras de origem genética (decorrentes dos chamados erros inatos do metabolismo – EIM) tão incomuns que não chegam a atrair a atenção da grande indústria farmacêutica. Para o tratamento dessas moléstias, é preciso recorrer a medicamentos órfãos, importados. Juntas, porém, as doenças raras atingem milhares de pessoas no Brasil.

Incidência – Há tempos o dia 29 de fevereiro, a mais rara das datas, foi escolhido simbolicamente como o Dia Mundial das Doenças Raras. O fato dá a medida de como se sentem “esquecidos” os portadores de algumas doenças pouco comuns. Sua incidência na maioria das vezes não justifica esforços das grandes companhias farmacêuticas. Os fármacos produzidos para o tratamento dessas doenças são chamados de “medicamentos órfãos”.

Na Europa, a definição oficial diz que doença rara é aquela que atinge até 5 habitantes em cada 10 mil. Somente no continente europeu há 25 milhões de pessoas que sofrem com alguma das 6 mil doenças consideradas raras. Dessas, presume-se que existam tratamentos para cerca de 200 a 300 moléstias.

Brasil – Não há muitas estatísticas a respeito no Brasil. Entre as doenças que afetam um pequeno número de pessoas, a porfiria é das mais polêmicas. Trata-se de uma doença genética caracterizada por uma deficiência de enzimas no organismo, que provoca dores abdominais agudas e pode levar à morte, se não cuidada corretamente.

O tratamento requer medicamentos importados, cuja aquisição é dificultada pelos entraves na legislação brasileira, o que acaba provocando, em muitas ocasiões, o risco de morte do paciente. Calcula-se que, em função da ascendência europeia e outros fatores, cerca de 19 mil pessoas são portadoras da doença no Brasil.

“Vampirismo” – Há dois tipos principais de porfiria: as agudas e as cutâneas. Nas agudas, predominam os  sintomas neuropsiquiátricos e viscerais. A dor abdominal é o sintoma mais comum, ocorrendo também náusea, vômito, constipação, dor e fraqueza muscular, retenção urinária, arritmias, confusão mental, alucinações e convulsões. Algumas porfirias agudas podem também desenvolver sintomas cutâneos. Nas porfirias cutâneas, os sintomas em geral se restringem à pele, nas partes expostas ao sol, com formação de bolhas, cicatrizes, escurecimento, espessamento e aumento de pelos. É este tipo de porfiria que deu margem às lendas sobre vampirismo em todo o mundo.

Cistinose – doença rara muito grave e progressiva, que exige atendimento especializado constante e pode causar incapacidade para toda a vida, ronda os berçários do país, colocando em risco recém-nascidos e provocando dúvidas na cabeça dos pediatras. A cistinose nefropática é uma doença genética recessiva sistêmica (se estiver presente nos genes do pai ou da mãe, há 25% de chances de ser desenvolvida no recém-nascido), rara (1: 20/ 40 mil habitantes), mas fatal.

Hiperamonemia – doença rara, aguda, de impacto fulminante, cujo diagnóstico é difícil, começa a preocupar a classe médica no Brasil. A hiperamonemia (taxa elevada de amoníaco no sangue) tem conseqüências muito graves em crianças e adultos, produzindo seqüelas para toda a vida ou causando a morte em muitos casos. O diagnóstico é dificultado pelo fato de haver pouquíssimos hospitais no Brasil aparelhados para detectar a dosagem de amônia no sangue. “Tivemos dois casos comprovados de óbito em virtude da doença este ano, mas certamente há outros não diagnosticados por aí. Há gente morrendo sem saber que tem a doença”, alerta o médico Charles Lourenço, do ambulatório de neurogenética do HC de Ribeirão Preto, um dos principais especialistas brasileiros em doenças raras de origem genética.